Com rios poluídos e sem peixes, povo Yanomami recebe cestas básicas com sardinhas enlatadas

Brasil

Entre os itens alimentícios que compõe a cesta, além da lata de sardinha, estão arroz, feijão, farinha e leite. Maior território indígena do Brasil passa por grave crise sanitária e humanitária.

Com rios sem peixes e contaminados pelo garimpo ilegal — que também afugenta a caça –, indígenas que vivem na Terra Yanomami recebem cestas básicas com sardinhas enlatadas da Força Aérea Brasileira (FAB) (veja o vídeo acima). O maior território indígena do Brasil passa por uma grave crise humanitá e sanitária em que dezenas de adultos e crianças sofrem com desnutrição grave e malária.
A FAB participa da ajuda humanitária desde o dia 21 de janeiro, ocasião em que o presidente Lula (PT) visitou a Casa de Saúde Indígena (Casai) para ver a crise. Ao todo, até essa quinta-feira (2), já foram mais de 3 mil cestas básicas entregues na região de Surucucu de avião. Os alimentos são arremessados de paraquedas pelos militares.

São dezenas de casos de malária e desnutrição grave entre os indígenas. A situação se agravou muito nos últimos anos, com o descaso do governo Bolsonaro e o avanço do garimpo ilegal.
O g1 acompanhou nessa quinta-feira (2) um desses voos que levam as cestas básicas para Surucucu, no território Yanomami. Foram 2h de sobrevoo partindo da Base Aérea de Boa Vista.

Dentro da aeronave, uma KC-390, oito caixas com 500 quilos de alimento cada estavam sendo levados por seis militares. Entre os itens alimentícios que compõe a cesta está arroz, feijão, farinha e leite. Cada cesta básica contem ao menos oito latas de sardinha.

Desde o começo da ajuda humanitária, 61,6 toneladas de medicamentos e mantimentos foram entregues na TI. Além disso, 37 ações de transporte de pacientes foram feitos em helicópteros da FAB.
Além da KC-390, a Força Aérea utiliza as aeronaves C-105 Amazonas, C-98 Caravan, C-97 Brasília e o helicóptero H-60 Black Hawk.

As doações são as mesmas para todas as comunidades do território. O avião parte de Boa Vista e não aterrissa em Surucucu.
Na pista do Quarto Pelotão de Fronteira de Surucucu, três caixas com os alimentos são lançadas a aproximadamente 200 metros de altura, que são recebidas por outros militares que estão aguardando. Em seguida, a aeronave faz a volta e joga o restante das caixas, que cai com paraquedas.

Um dos vários problemas trazidos pelo garimpo é a contaminação dos rios pelo mercúrio — metal pesado usado na extração de ouro–. Um estudo feito pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e divulgado em agosto de 2022 mostrou que peixes de três rios estão altamente contaminados por mercúrio oriundo de garimpeiros em Roraima.
Além da contaminação por mercúrio nos rios, o garimpo ilegal cresceu 54% em 2022 e devastou 5.053 hectares da Terra Indígena Yanomami, segundo um levantamento da Hutukara Associação Yanomami.
O território é o maior do Brasil, com mais 10 milhões de hectares. O número corresponde a extensão aproximada do estado do Pernambuco.

No local, vivem pouco mais de 30 mil indígenas na área que deveria, por lei, ser preservada. No entanto, tem sofrido com o avanço do garimpo ilegal. A HAY estima que, com a atividade irregular, 20 mil garimpeiros estejam no local.

A Terra indígena Yanomami está em emergência de saúde desde o dia 20 de janeiro, conforme decisão do governo Lula. Inicialmente por 90 dias, órgãos federais auxiliarão no atendimento aos indígenas.
Segundo o Ministério dos Direitos Humanos, há 22 suspeitas de omissões do governo anterior, liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), no combate à tragédia Yanomami.
O Supremo Tribunal Federal (STF) apura se o governo Bolsonaro prestou informações falsas sobre assistências oferecidas aos indígenas. O ministro Luís Roberto Barroso determinou que autoridades sejam investigadas por suspeita de genocídio.

Após várias imagens e relatos de avanço de doenças na Terra Yanomami, o Ministério da Saúde declarou emergência de saúde pública para combater desassistência de indígenas no território.
O governo federal também criou o Comitê de Coordenação Nacional para discutir e adotar medidas em articulação entre os poderes e prestar atendimento a essa população.
O plano de ação deve ser apresentado no prazo de 45 dias, e o comitê trabalhará por 90 dias – prazo que pode ser prorrogado.

Após visitar a Terra Indígena, o secretário de Saúde Indígena (Sesai) do Ministério da Saúde, Weibe Tapeba, disse que o cenário é de guerra e que planeja instalar dentro do território um hospital de campanha para atender os inúmeros indígenas doentes.

Autoridades locais – como o Ministério Público Federal (MPF), líderes indígenas, organizações como a Hutukara Associação Yanomami e ambientalistas – afirmam que a maior causa para se chegar ao atual caos sanitário da Terra Indígena foi o avanço do garimpo, frente à omissão do estado brasileiro em assegurar a proteção do território e, consequentemente, aos Yanomami.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, que esteve em Roraima com Lula, determinou abertura de inquérito policial para apurar o crime de genocídio e crimes ambientais na Terra Indígena Yanomami.
No último dia 25, a Polícia Federal abriu inquérito para investigar se houve crime de genocídio e omissão de socorro na assistência dada pelo governo federal aos Yanomami. A investigação foi aberta a pedido de Dino e vai tramitar em Roraima. No dia 26 de janeiro, foram feitas diligências na Casai.

Fonte: G1