Escola de Comunicações da USP terá professora trans pela 1ª vez: ‘Inversão da lógica do lugar que uma travesti pode ocupar’

Brasil

A professora doutora Dodi Leal foi convidada para lecionar no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA), no primeiro semestre de 2023.

A Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA) terá, pela primeira vez na história, uma docente travesti. A professora doutora Dodi Leal foi convidada para lecionar no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas no primeiro semestre de 2023.
Doutora em psicologia social pelo Instituto de Psicologia da USP, Dodi ministra agora a disciplina ‘Fabulações Travestis sobre o Fim’, que aborda conceitos teórico-práticos que envolvem “práticas performativas e corporalidades na cena, além de ser baseada em referências de temporalidades nas artes cênicas”.
Além de ser da área acadêmica, Dodi Leal é performer, pesquisadora em Artes Cênicas e iluminadora cênica. Na Universidade Federal do Sul da Bahia, é professora efetiva.
“Lecionar na USP é um marco de reconhecimento do meu trabalho no Sul da Bahia e também na cena artística trans brasileira. Sou a primeira pessoa trans a se efetivar no ensino superior público de artes do mundo, isso sempre foi uma denúncia, porque só agora, e ainda apenas uma”, afirmou Dodi ao g1.
“É preciso que universidades grandes como a USP tenham pessoas trans no seu quadro docente”, disse.
“Para a sociedade, representa uma inversão da lógica do lugar que uma travesti pode ocupar. Saber que pessoas trans pesquisam artes na pós-graduação, que são docentes de universidades renomadas, criam espetáculos de dança, teatro e performance, tudo isso amplia as perspectivas dos lugares que podemos ocupar”, destacou.

Apesar da importância, a professora disse que não se pode romantizar o contexto em que ela está inserida;
“Assim como as mulheres negras, somos exigidas de atuar em milhares de funções na universidade e ficamos sobrecarregadas. Nos cansar também é um projeto de nos excluir do próprio espaço digno de trabalho”, contou.
Aproveitando o espaço que terá no ambiente acadêmico, ela chamou outras pessoas trans para colaborar com as aulas na USP:
A roteirista Alice Marcone, que dará uma oficina de textualidade no audiovisual; e a artista-educadora Isadora Ravena, com uma oficina de fabilhetações na cena e uma conferência sobre travestilidade ambiental.

Passado, presente e futuro
Há 8 anos, quando cursava o doutorado em psicologia, Dodi teve a oportunidade de ministrar a disciplina de Teatro do Oprimido a convite de seu orientador, Luis Galeão-Silva.
Atualmente, além dela, Gabrielle Weber, da Escola de Engenharia de Lorenao, e Silvana Nascimento, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), também são trans e professoras efetivas da USP.
“Espero que o trabalho de pessoas trans como docentes — da educação popular, como comecei, até o ensino superior — seja cada vez mais reconhecido e, sobretudo, que nossas vidas e produções não sejam cafetinadas e tuteladas. Digo isso porque, infelizmente, apesar de acessarmos cada vez mais espaços, o pensamento e a arte produzida por pessoas trans ainda passa por muitas situações de rebaixamento estético, rebaixamento cognitivo e rebaixamento político”, pontuou.

Fonte: G1