3 fatores que bolsonaristas celebram na vitória de Donald Trump

Política

A volta de Donald Trump à Casa Branca como novo presidente americano deverá produzir efeitos políticos diretos no Brasil e no mundo, segundo expoentes da direita bolsonaristas ouvidos pela BBC News Brasil.

Poucos dias antes das eleições americanas, realizada na terça-feira (5/11), na qual Trump derrotou a candidata democrata e atual vice-presidente Kamala Harris, a reportagem conversou com Paulo Figueiredo, ex-comentarista da Jovem Pan, e Ernesto Araújo, que chefiou o Itamaraty no governo Bolsonaro.

Ambos se envolveram, em diferente intensidade, em um esforço de brasileiros na campanha online pró-Trump e atuam como uma interface entre representantes da direita do Brasil e dos Estados Unidos, se consolidando como vozes influentes na diáspora brasileira em território americano.

Araújo soma quase 900 mil seguidores em sua conta no X (antigo Twitter) e, atualmente licenciado do Itamaraty, vende cursos online de formação política à direita, que ele admite ter criado sob “inspiração” do guru Olavo de Carvalho, morto há dois anos.

Já Figueiredo, cuja conta na rede social X está atualmente bloqueada no Brasil por determinação do Supremo Tribunal Federal, reúne 1,3 milhão de seguidores ali. Nos EUA, ele consegue operar seu perfil normalmente, sem restrições legais.

Figueiredo é alvo de investigação da Polícia Federal, que o acusa de ter participação na suposta tentativa de golpe de Estado liderada por alguns expoentes do governo de Bolsonaro depois da derrota eleitoral de 2022, o que ele nega.

Em diferentes graus, Araújo e Figueiredo estão convencidos de que, no poder, Trump colocará em evidência o ex-presidente Bolsonaro, levará o bolsonarismo a retomar seu foco em uma agenda de direita radical, produzirá impactos no modo como o Brasil combate as fake news e deverá aprofundar os intercâmbios políticos de lideranças conservadoras de direita em âmbito global.

Bolsonaro em evidência e mudança de atmosfera

Paulo Figueiredo recorda que o ex-presidente Donald Trump tem “um enorme carinho pessoal” por Bolsonaro e por seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro. Ele acredita que essa proximidade vai derivar em uma maior e natural atenção ao político brasileiro.

Os bolsonaristas não estão sozinhos na avaliação. O ex-subsecretário do Departamento de Estado para o Hemisfério Ocidental, Thomas Shannon, que serviu também como embaixador dos Estados Unidos no Brasil, vê na volta de Trump ao poder como o provável início de um novo capítulo da recente história espelhada que Brasil e Estados Unidos têm escrito.

Nos últimos dez anos, os dois países viveram o desgaste dos políticos tradicionais, a ascensão ao poder de modelos populistas de direita, a derrota nas urnas dos representantes desse modelo (Trump e Bolsonaro), as contestações ao modelo democrático que culminaram em ataques físicos às instituições pelos apoiadores desses líderes, como a invasão ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, e a depredação da Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023.

Trump reeleito, disse Shannon, “deve ajudar Bolsonaro, porque mostra que é possível perder e ainda assim voltar ao poder quatro anos depois”.

A questão é que, à diferença de Trump, Bolsonaro está inelegível.

O ex-presidente, que também é alvo de outras investigações no âmbito da Polícia Federal, não pode concorrer a cargos eletivos até 2030.

Em sentença de junho de 2023, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) entendeu que ele cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação em uma reunião com embaixadores durante a campanha de 2022 na qual atacou, sem provas, as urnas eletrônicas.

Bolsonaro, no entanto, refuta o veredito e tem dito que vai concorrer em 2026, sem explicar como. Para que isso aconteça, ele teria que conseguir deixar sem efeito a punição do TSE.

Um dos caminhos seria aprovar no Congresso um projeto de anistia para ele e envolvidos no ataque à sede dos Três Poderes em janeiro de 2023.

A avaliação de analistas, no entanto, é que Bolsonaro, ao mesmo tempo em que demonstrou força nas eleições municipais nas grandes cidades, também amargou derrotas, o que não faria a pauta de anistia tão forte no Congresso.

Tanto Figueiredo como o ex-chanceler Araújo foram categóricos em dizer que Trump “não se envolveria na política interna do Brasil” quando perguntados sobre como o governo do republicano poderia influenciar a aprovação de um projeto de anistia.

Mas não descartam que Trump seja capaz de promover uma mudança de atmosfera que faça as autoridades brasileiras repensarem suas ações.

Musk e expectativa de pressão sobre Lula e STF

do governo também.”

“Se o Brasil continuar violando os acordos internacionais do qual é signatário, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, se o Brasil continuar nessa flagrante violação [do direito à liberdade de expressão], pode ser que leve a administração Trump ao ponto de, se necessário, aplicar sanções diretamente ao Brasil”, opina Figueiredo.

Internacional de direita e volta ao bolsonarismo-raiz
Ernesto Araújo e, em menor grau, Paulo Figueiredo, expressaram certa expectativa de que o retorno de Trump ao poder leve Bolsonaro a retomar uma agenda mais ideológica e programática em direção à direita radical.

“Se o Trump vier com determinadas políticas que seriam semelhantes provavelmente às do mandato anterior, isso nos anima no Brasil, quem acredita nessas políticas de ideário conservador, até porque mostra que há viabilidade eleitoral nelas”, diz Araújo.

Para ele, “o bolsonarismo se aproximou do centrão, não o centrão que se aproximou do bolsonarismo”, afirma.

“Mas o exemplo de Trump, que volta ao poder sem ter se aliado a um Valdemar [da Costa Neto, presidente do PL], faz também ressurgir programas e discussões que estavam enterradas.”

Trump foi capaz de colonizar completamente o Partido Republicano, enquanto que Bolsonaro falhou em criar o seu Aliança Brasil e acabou abrigado na legenda de Valdemar. “Eu acho um erro”, diz Figueiredo.

“Nos EUA, foi a liderança que absorveu o partido, no Brasil foi o contrário”, critica Araújo, que diz que a emergência do ex-coach e empresário Pablo Marçal, candidato derrotado nas eleições de São Paulo, é exemplo da “demanda que existe por um líder populista de direita.”

Ernesto Araújo, que atualmente trabalha na assessoria internacional do partido de direita radical espanhol Vox, diz esperar que a chegada de Trump ao poder possa fortalecer a articulação de lideranças conservadoras em âmbito global.

A volta de Trump poderia, na visão do ex-chanceler, impulsionar o Foro de Madrid, uma espécie de internacional dos ideários conservadores e anticomunistas criada em 2020.

Araújo se entusiasma com as ideias de gestão que Elon Musk possa trazer para o grupo e imagina que os países possam replicar as estratégias de rede do bilionário.

O ex-chanceler brasileiro também tem a expectativa de que a chegada de Trump ao poder gere uma injeção de dólares no intercâmbio internacional deste campo político.

Fariam parte desta rede húngaros ligados ao governo de Viktor Orban, italianos do grupo da premiê Georgia Meloni, poloneses ligados ao presidente do país Andrzej Dudah, além de latinos dos movimentos de Javier Milei, na Argentina, e José Antônio Kast, no Chile.

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