Em janeiro, o deputado republicano Kevin McCarthy fechou um acordo para se tornar presidente da Câmara que dava a qualquer membro do Congresso o poder de forçar uma votação sobre a possibilidade de destituí-lo.
Na terça-feira (03/10), um republicano — Matt Gaetz — fez exatamente isso. E, com a ajuda dos democratas, conseguiu tirar McCarthy do cargo.
Agora, a maioria dos republicanos está perguntando qual será o rumo da Casa. Quase todos votaram para manter McCarthy no cargo, mas bastaram alguns rebeldes para mergulhar a Câmara no caos.
Por meses, McCarthy trabalhou para manter a direita sob seu comando.
Ele concordou em abrir uma investigação de impeachment contra o presidente Joe Biden, que é democrata. Ele desistiu de um acordo que havia selado com os democratas no início do ano para aumentar o limite da dívida. Ele permitiu que os conservadores incluíssem trechos alinhados à direita em projetos de lei relacionados ao orçamento e a outros assuntos.
Mas todos os seus esforços foram em vão. Quando o presidente da Câmara precisou contar com o apoio democrata para evitar o chamado shutdown (paralisação dos pagamentos federais em função da falta de aprovação do novo orçamento), seu destino político mudou.
McCarthy ainda poderia ter lutado reconquistar o poder — por exemplo convencendo os republicanos que se viraram contra ele a mudarem de ideia, como fez em janeiro. Mas parece que restavam poucas opções, e na noite de terça-feira (3/10), ele indicou que não concorreria novamente.
O cargo de presidente da Câmara que ele buscou durante grande parte de sua carreira política acabou sendo um cavalo de Troia — e, após o término da votação para destituí-lo, ele parecia quase aliviado quando colegas republicanos foram lhe cumprimentar.
Não importa qual republicano venha a substituí-lo, as divisões dentro do partido, que tem maioria na Casa, permanecerão. E os desafios para gerir a Câmara continuam os mesmos.
Embora a destituição tenha sido histórica — McCarthy foi o primeiro presidente da Câmara a ser retirado por votação na Casa —, ela também é sintoma de uma luta feroz entre os republicanos, divididos entre uma ala tradicional e uma base radical que surgiu com o movimento Tea Party, de 2010.
É um embate entre pureza de valores e pragmatismo; entre trabalhar dentro do sistema e mudá-lo.
Foi por pouco que McCarthy conseguiu ser eleito presidente da Câmara em janeiro, graças ao apoio de alguns poucos rebeldes republicanos. E foram justamente esses rebeldes republicanos que derrubaram McCarthy na terça-feira.
Mas o grande protagonista da noite foi seu rival, Matt Gaetz, que entrou com a “moção para desocupar a cadeira”.
Enquanto os republicanos que defendiam McCarthy se revezavam durante uma hora de debate antes da votação final, foi Gaetz — posicionado no lado democrata da Câmara, mas conversando com seus colegas republicanos — quem aproveitou a maior parte do tempo para defender a destituição de seu correligionário e antagonista.
O que ficou claro foi que ambos os lados da divisão republicana acham que Washington está com um grave problema financeiro.
Para Gaetz, o processo pelo qual os gastos federais são aprovados é o maior motivo para isso. Ele criticou a forma como o Congresso aprova projetos de lei de grandes gastos para diferentes partes do governo federal, que muitas vezes são negociados a portas fechadas e depois votados em um grande pacote.
Ele também criticou McCarthy por fazer concessões aos democratas — que controlam o Senado e a Casa Branca — durante as negociações sobre o orçamento e o limite da dívida. Gaetz defendeu que, se o seu partido não adotasse uma linha mais dura, nada em Washington mudaria.
Os defensores de McCarthy, por outro lado, disseram que chegar a um acordo faz parte do processo — e que o então presidente da Casa tinha conseguido, apesar de tudo, avançar com a agenda conservadora.
O congressista republicano Kelly Armstrong acusou políticos como Gaetz de colocar a arrogância e a arrecadação de fundos acima da governabilidade.
“Nos rebaixamos para um lugar onde cliques, o sucesso na TV e a busca incessante pelo gosto mais medíocre das celebridades impulsionam decisões e incentivam o comportamento juvenil.”
Neste momento, a Câmara dos Representantes dos EUA é uma instituição em crise — sem presidente e sem um caminho claro para se eleger um novo nome para o cargo.
O processo de destituição terminou na tarde de terça-feira. Os republicanos, parecendo em estado de choque, encontraram-se a portas fechadas para pensar no que querem fazer agora.
Já os democratas riram de tudo — aparentemente com a crença de que este caos os beneficiará.
Mas a Casa está navegando por águas desconhecidas. E com a iminência de uma paralisação do governo em meados de novembro, deve haver mais turbulência no horizonte.