O presidente da França, Emmanuel Macron, chega ao Brasil na terça-feira (26/3) para sua primeira visita bilateral a um país da América Latina desde que assumiu o poder, em 2017.
O país será o único da região a ser visitado desta vez pelo presidente francês. Ele vai ficar três dias e passar por cinco cidades: Belém, Rio de Janeiro, Itaguaí (RJ), São Paulo e Brasília.
Macron terá encontros com o presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) no início e no final da viagem.
Sua visita tem um caráter simbólico importante, avalia Carolina Pavese, a doutora em Relações Internacionais pela London School of Economics (LSE) e especialista em Europa.
“Essa visita é simbólica para romper um período de tensão nas relações entre o Brasil e a França vivido durante o governo Bolsonaro”, diz Pavese à BBC News Brasil.
Durante os quatro anos em que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) governou, ele e o presidente francês chegaram a trocar farpas públicas. A visita marca, portanto, uma reaproximação.
“É uma aproximação tardia, uma vez que Macron ainda não havia vindo ao Brasil ou à América Latina, mas que finalmente está ocorrendo.”
O presidente francês será recebido em Belém por Lula, com quem mantém um relacionamento aparentemente mais amistoso do que o que teve com Bolsonaro.
Segundo o Itamaraty, o comércio, o combate às mudanças climáticas e a cooperação militar serão alguns dos principais eixos da visita de Macron ao Brasil.
Lula e Macron já deram demonstrações de convergências em temas que vão do combate ao avanço da extrema-direita no mundo, defesa do meio ambiente e a necessidade de um cessar-fogo no conflito na Faixa de Gaza.
Apesar disso, diplomatas e especialistas ouvidos pela BBC News Brasil avaliam que a viagem de Macron também deverá deixar evidentes as principais divergências entre os dois presidentes.
Entre elas estão a oposição de Macron ao acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul e o tratamento dado pelo Brasil durante as reuniões do G20, presidido pelo Brasil, à guerra na Ucrânia.
Submarinos, combate à direita radical e Gaza
direita que negam a política e vendem soluções tão fáceis quanto equivocadas”, disse Lula em discurso na Assembleia Geral da ONU.
Ainda no âmbito político, os governos do Brasil e da França vêm convergindo em relação às tentativas de pôr um fim ao conflito na Faixa de Gaza.
Em outubro do ano passado, pouco depois do início da ofensiva israelense sobre o território palestino, a França apoiou uma proposta que o Brasil havia feito ao Conselho de Segurança da ONU propondo pausas humanitárias em meio ao conflito.
A França é membro permanente do conselho e tem direito a veto e, na época, o Brasil exercia a presidência rotativa do colegiado.
A proposta, no entanto, acabou sendo rejeitada pelo veto dos Estados Unidos.
Publicamente, Macron e Lula condenaram as ações terroristas praticadas pelo Hamas contra Israel, mas vêm criticando o governo israelense pela escala da reação militar na Faixa de Gaza, embora o tom adotado pelo brasileiro tenha causado reação por parte de Israel.
“De fato, hoje, civis estão sendo bombardeados. Esses bebês, essas senhoras, esses idosos são bombardeados e mortos. Então, não há razão para isso e não há legitimidade. Por isso, nós instamos Israel a parar”, disse Macron em entrevista à BBC News em novembro do ano passado.
Lula, por sua vez, classificou a ação de Israel na Faixa de Gaza como um “genocídio” e fez uma menção ao extermínio de judeus pelo regime nazista.
“O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu: quando o Hitler resolveu matar os judeus.”
Após a fala, o governo de Israel reagiu e declarou que o presidente brasileiro é persona non grata no país.
Na linguagem diplomática, a expressão se aplica a um representante estrangeiro que não é mais bem-vindo em missões oficiais em determinado país.
Autoridades francesas afirmaram, na semana passada, que a crise no Oriente Médio estará na agenda de discussões entre Lula e Macron.
de líderes já realizadas até o momento. Em março, por exemplo, houve um impasse durante a reunião de ministros de finanças do grupo sobre como o conflito seria tratado no comunicado final do encontro.
Segundo o jornal “O Estado de S.Paulo”, o impasse se deu porque um grupo de países defendia que o tema fosse tratado como “War on Ukraine”, ou seja: Guerra contra a Ucrânia. Outro grupo, defendia que o tema fosse tratado como “War in Ukraine”, ou seja: Guerra na Ucrânia.
“A expectativa é de que Macron tente influenciar a agenda do G20 para que o Brasil dê mais importância ao conflito na Ucrânia. Apesar de o Brasil condenar a invasão russa, o país vem tratando esse assunto com muita cautela e Macron gostaria de uma posição mais enfática”, disse Carolina Pavese.
Na semana passada, autoridades do governo francês disseram a jornalistas que Macron tentará encontrar “convergências” sobre o tema com Lula para definir uma possível agenda de suporte à Ucrânia.
O presidente francês têm sido um dos principais aliados do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, desde que a Rússia iniciou sua ofensiva militar sobre o país em 2022.
Lula, por sua vez, vem sendo criticado por parte da comunidade internacional em razão da sua postura em relação ao conflito.
Ele deu declarações apontando que tanto Zelensky quanto o presidente russo, Vladimir Putin, seriam responsáveis pela guerra.
Em fevereiro do ano passado, por exemplo, Lula disse em entrevista que o Brasil não forneceria armas para a Ucrânia, contrariando diversos aliados europeus e os Estados Unidos.
Em abril do ano passado, Lula chegou a criticar os Estados Unidos e a Europa por fornecerem armamentos para a Ucrânia, o que, para os europeus, é considerado fundamental para evitar o avanço russo sobre o país.
O governo aliás, não atendeu a pedidos para fornecer armamentos ao país.
A diplomata Maria Luísa Escorel de Moraes disse, na semana passada, que a guerra na Ucrânia, assim como o conflito em Gaza, deverá fazer parte das conversas entre os dois presidentes.
A expectativa é de que Lula e Macron se dirijam à imprensa na quinta-feira (28/03), último dia da viagem do presidente francês.
Fonte: BBC Brasil