Continuando a nossa série de estudos sobre os pecados capitais, tomemos conhecimento, agora, sobre o pecado da gula e o remédio para combatê-la: a temperança.
O pecado da gula – Gastrimargia – consiste no excesso do comer e beber. Ensina padre Paulo Ricardo, no seu livro “Um Olhar Que Cura”, a própria origem etimológica da palavra […], que nos ajuda a compreender melhor esse pecado. A primeira parte – gastri – não é difícil de intuir, pois diz respeito ao estômago. Mas o que é margia? Márgos, em grego, quer dizer louco, alguém que está fora de si. Trata-se, portanto, de uma “loucura do estômago”.
O que é a gula?
Às vezes, de maneira maldosa, o pecado da gula é atribuído para as pessoas que estão acima do peso. Mas isso não necessariamente é verdade. Os magrinhos, na verdade, podem ser os mais fáceis de cair no pecado da gula, pois comem exageradamente e não correm o risco de engordar. O que quero dizer é que o pecado da gula não está relacionado ao peso da pessoa, mas sim com o excesso de comer ou beber.
Muitas vezes, o pecado da gula é tratado como um “pecadinho”, mas não é bem assim; ele é grave, pois se trata de um pecado gerador de muitos outros. Nisso os padres da Igreja são unânimes em descrever sobre o mal gerado pelo pecado da gula. Entre os padres da Igreja, vale salientar os ensinamentos de São João Clímaco (525-606). Em uma de suas obras, a que ele chamou de “A Escada do Paraíso”, ele descreve uma grande lista de pecados gerados pelo pecado da gula. No seu livro, ele interroga a gula dizendo: “Fala, ó tirana de todos os mortais!”. E ela responde fazendo uma lista das doenças espirituais que derivam dela.
“O meu filho primogênito é o espírito da fornicação; depois dele, em segundo lugar, vem a dureza de coração; e em terceiro lugar o sono. Depois, é de mim que provem o mar dos maus pensamentos, as ondas da imundície, o abismo das impurezas desconhecidas e inomináveis! Minhas filhas são a preguiça, o mexerico, o atrevimento, a chacota, a bufonaria, a contestação, a birra, a desobediência, a insensibilidade, a escravidão, a autossuficiência, a arrogância, o exibicionismo, e depois destas coisas vêm a oração impura, os pensamentos agitados (“Um olhar que cura”).
Pecados capitais
A partir dessa lista de pecados gerados pela gula, perceba que não se trata de um “pecadinho”, mas sim de um pecado capital, capaz de gerar muitos outros. Portanto, devemos combatê-lo da nossa vida para então não virmos a cometer outros pecados filhos da gula.
Santa Catarina de Sena ensinava que o “estômago cheio prejudica a mente”. Também Santo Ambrósio falava algo importante sobre a modéstia no comer. “Aquele que submete o seu próprio corpo e governa sua alma, sem se deixar submergir pela paixões, é seu próprio senhor: pode ser chamado rei, porque é capaz de reger a sua própria pessoa”. Esse ensinamento mostra que, se alguém não freia seu apetite no comer, dificilmente freará nas outras áreas de sua vida.
Sabendo agora que o pecado da gula não é tão simples como imaginamos, torna-se importante, como qualquer doença, encontrar o remédio para curá-la. O melhor remédio para combater a gula é a temperança, isto é, evitar todo excesso tanto no comer quanto no beber. E para alcançar a virtude da temperança a Igreja oferece o jejum.
Temperança
Diz São Paulo: “Conduzi-vos pelo Espírito Santo e não satisfareis o desejo da carne” (Gal 5,16). “Se viverdes segundo a carne, morrereis, mas, se pelo Espírito fizerdes morrer as obras do corpo, vivereis.” (Rom 8,12).
O jejum nos dá a possibilidade de não nos deixarmos conduzir pelos prazeres da carne. Ele nos capacita para alcançarmos as alegrias eternas. O jejum nos ajuda a dizer não diante de nossas vontades desregradas além de ser auxílio no combate às paixões desordenadas dentro de nosso coração. Além do mais, como ensinava São João da Cruz, o jejum ajuda a cortar o amor aos prazeres deste mundo.
Existem muitas maneiras de realizarmos o jejum, desde a mortificação em não comer alguns alimentos, até o jejum total. O importante é que cada pessoa escolha a forma que lhe seja mais adequada.
Descobrindo a doença, o passo seguinte é tomar o remédio. Portanto, tiremos do jardim de nosso coração a erva daninha da gula, e tomemos o remédio da temperança por meio do jejum. De modo que nosso coração, desprendido das coisas terrenas, possa vislumbrar as coisas eternas.